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As “reinações” de Lobato na Argentina III – Benjamin de Garay, por Thais de Mattos


Benjamin de Garay (? – 1943) foi desses nomes que circularam entre a elite intelectual brasileira dos anos 1920, mas sobre o qual se sabe pouquíssimo.
    Nascido na província argentina de Santa Fé, Garay, desde a adolescência, era amigo de Manuel Gálvez, seu conterrâneo.
    Anos depois, os dois foram para Buenos Aires e traçaram suas carreiras de formas distintas, mas relacionadas ao universo dos livros: Gálvez escrevia e editava livros e dirigiu a revista Ideas, Garay fazia trabalhos como tradutor.
    Embora não sejam claras as circunstâncias que levaram Garay a viver no Brasil, sabe-se que, a partir de 1920, ele viverá na ponte aérea Buenos Aires - Rio de Janeiro - São Paulo. Tal fato aproxima o tradutor argentino de nomes como Monteiro Lobato.
    Garay e Lobato, provavelmente, se conheceram por intermédio de Manuel Gálvez, com quem o brasileiro trocou cartas desde 1919, e quando surgiu a possibilidade de traduzir Urupês para o castelhano, o que aconteceu em 1921, pela Editorial Patria, de Manuel Gálvez.
    Mas não só.
    Garay aproximou-se do grupo modernista de São Paulo, o que lhe permitiu integrar a equipe da revista A Colméia; é, também, a partir do fortalecimento dessa relação com o periodismo paulista que alguns escritores brasileiros – e Monteiro Lobato – passaram a ter seus livros divulgados na capital portenha.
    Além do trabalho na revista, Garay intensificou as traduções de brasileiros para o castelhano e propôs a criação de A Novela Semanal, similar de La Novela Semanal, que circulou na Argentina no período de 1917 a 1925. Em 1921, saiu o primeiro número da publicação em português, pela Editora Olegário Ribeiro. O estreante? Monteiro Lobato e seu texto “Os Negros”.
    Garay, desse modo, configura-se como importante agente e consolidador das relações literário-culturais entre Brasil e Argentina.
    Se Lobato construiu sua carreira e se tornou “comum de dois países” no que se refere à literatura infantil, Garay se tornou “comum de dois países” ao intermediar as aproximações entre os dois países.

Thaís de Mattos Albieri (São Paulo, Brasil)
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As “reinações” de Monteiro Lobato na Argentina II – Manuel Gálvez, por Thais de Mattos Albieri


A primeira “reinação” de Monteiro Lobato na Argentina aconteceu em 1921, com a publicação de Urupês em castelhano, publicado pela Editorial Patria, de Buenos Aires, de propriedade de Manuel Gálvez (1882-1962), que também já havia sido um dos donos da revista Ideas e Inspector de La Enseñanza Secundaria; publicado em 1918 em português, o livro ganhou as prateleiras das livrarias da capital portenha apenas três anos depois de sua publicação.
    Com trajetórias muito parecidas em seus respectivos países, Lobato e Gálvez, antes do lançamento do livro do brasileiro em terras portenhas, mantiveram – a partir de 1919 – correspondência que resultaria na tal edição lobatiana.
    As cartas trocadas entre os dois revelam, inicialmente, o interesse de publicação do livro em Buenos Aires. Manuel Gálvez escreve a Lobato dizendo que Urupês “encanta”.
Mas por que o encantamento do argentino?
    Urupês é um livro que poderia ser considerado regionalista, dado que os temas que percorrem o livro são as queimadas que assolavam as terras brasileiras. Além disso, a figura do o jeca-tatu – o homem tipicamente do campo – aparece pela primeira vez.
    Essa “identificação” pela diferença provocada por Urupês seria, talvez, um dos motivos pelos quais o argentino encantara-se, propondo a imediata publicação do livro de Lobato, apenas 1 ano depois de sua edição em português.
    Depois de uma série de cartas trocadas entre 1919 e 1921, finalmente saiu Urupês em castelhano, publicado pela Editorial Patria, de Buenos Aires e de Manuel Gálvez. Depois do sumiço de Aguirre, que seria, inicialmente, o tradutor, o livro teve tradução de Benjamin de Garay.
    Garay, amigo de Gálvez desde os tempos em que os dois – ainda adolescentes – viviam em Santa Fé teve uma vida sobre a qual se sabe pouquíssimo.
    Porém, vários fatos ligam o ligam ao Brasil, além da tradução de Urupês: a proximidade com os modernistas brasileiros, seu nome no quadro de funcionários da Embaixada do Brasil, a tradução de Os Sertões (Euclydes da Cunha) e de títulos de Graciliano Ramos para o castelhano, a ponte aérea (e literária) entre São Paulo-Rio de Janeiro e Buenos Aires...esses fatos todos acabaram por fazer de Benjamin de Garay um dos grandes articuladores das trocas literárias Brasil – Argentina.
    Embora não se possa atribuir categoricamente a proximidade de Manuel Gálvez e Monteiro Lobato a Benjamin de Garay, o que se pode dizer, com certa propriedade (e o uso da palavra “certa” aqui é para marcar que, em se tratando de literatura qualquer afirmação categórica pode ser perigosa!), é que se juntou muito bem o brasileiro que dava os primeiros passos como editor, escritor e dono de revista, com um argentino que já tinha experiência como proprietário de revista e editor e dava os primeiros passos para que sua obra fosse lançada no Brasil.
    Tudo isso com a ajuda de outro argentino: Benjamin de Garay.
    Mas este fica para a terceira “reinação” de Lobato na Argentina.




Thais de Mattos Albieri (San Pablo, Brasil)

Otras notas de Mattos Albieri en EdM: https://escritoresdelmundo.com/search/label/Mattos%20Albieri
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As “reinações” de Monteiro Lobato na Argentina, por Thais de Mattos Albieri


Monteiro Lobato (1882-1948) está “com tudo e não está prosa”, como se diz em bom português popular. Isso porque ganhou, em abril deste ano, reedição em castelhano de seu livro Reinações de Narizinho, publicado pela Editorial Losada em parceria com a Embaixada do Brasil na Argentina. A edição é uma reprodução da obra traduzida por Juán Ramón Prieto e publicada pela Americalee, em 1944.
    Considerado pela história literária brasileira o maior escritor da literatura infantil do país e responsável por levar – há décadas – milhares de crianças (e por que não dizer adultos também?) aos países mais longínquos da ficção (país da Gramática, Reino das Águas Claras, país da Aritmética, para citar alguns), a republicação em castelhano reinicia no país vizinho uma trajetória pela literatura infantil que começou em 1937, com a publicação, em forma de folhetim no jornal La Prensa, da adaptação de Don Quijote de los Niños; traduzido por Benjamin de Garay (? – 1942), o texto ganhou as livrarias em 1938, editado pela Editorial Claridad.
    Começava, assim, a aventura da literatura infantil de Monteiro Lobato pela Argentina.
    No entanto, as “reinações” de Lobato em castelhano tiveram início 16 anos antes, em 1921, quando, editado por Manuel Gálvez (1884-1962) e traduzido também por Benjamin de Garay (?-1942), Urupês, livro para adultos, foi publicado e teve, assim como em português, sucesso de público.


    Começava, assim, a trajetória da literatura adulta de Monteiro Lobato na Argentina.
    As duas trajetórias de Monteiro Lobato pelo país do Prata serão motivo, aqui, de outras “reinações”... e há muitas: personagens reais e da ficção, discussões, opiniões e muita literatura.

Thais de Mattos Albieri (San Pablo, Brasil)

La autora ha realizado su tesis de doctorado sobre Monteiro Lobato en Unicamp (Univerisade Estadual de Campinas, Brasil)
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